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Licitações fracassadas de Resende são trampolim para contratações diretas e superfaturadas, diz denúncia ao MP

A prefeitura de Resende somava 47 licitações desertas ou fracassadas de 1º de janeiro até 11 de abril. Esse número é expressivo e, segundo uma denúncia encaminhada ao Ministério Público, é um esquema iniciado pelo governo do ex-prefeito Diogo Balieiro e que se mantém na administração do atual prefeito, Tande Vieira, para viabilizar contratações diretas, sem concorrência e superfaturadas.

Na prática, o suposto esquema está nos editais, com exigências e preços que inviabilizam o ingresso de empresas nos certames, que, fracassados e desertos possibilitam que a prefeitura celebre contratos emergenciais superfaturados.

De acordo com a denúncia, um desses possíveis trampolins para contratações emergenciais sem licitação foi o pregão eletrônico 76/2025, que fracassou recentemente ao tentar contratar um hotel no centro de Resende com o mínimo de 96 apartamentos e diária de R$ 142 cada um, para pessoas em situação de vulnerabilidade. Uma combinação de exigências que resultou no fracasso do pregão eletrônico.

“O PE 76/2025 é apenas um exemplo dessa prática que começou com o ex-prefeito Diogo Balieiro tão somente com objetivo de contratar empresas conchavados com ele e Tande”, diz a denúncia.

A denúncia acrescenta que as as licitações estão acontecendo pela Bolsa Nacional de Compras (BNC), que é uma plataforma privada, não homologada pelo Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP).

Em uma busca rápida pela internet, é possível averiguar a BNC e outras plataformas privadas são alvos de investigação do Tribunal de Contas da União (TCU) no que se refere ao caráter privado das plataformas. a BCN também não possui uma boa avaliação pelo ranking do Google.

Superfaturamento de R$ 2 milhões

Levada também para Itatiaia por Diogo Balieiro, onde o governo do prefeito Kaio do Diogo Balieiro passou a usar a plataforma privada desde janeiro, a BNC já foi denunciada ao Ministério Público pela possível limitação da ampla concorrência.

Esse ano, a empresa Souza & Costa Construções e Reformas Ltda entrou com um recurso junto ao Tribunal de Contas argumentando que a prefeitura de Resende não protocolou a Concorrência Eletrônica nº 045/2024 no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), optando pela não homologada Bolsa Nacional de Compras. Segundo a Souza e Costa, a Bolsa Nacional de Compras exige prévio cadastramento, além de pagamento para a participação na disputa.

Formalizada na gestão de Diogo, a concorrência, segundo a representação, teria sido feita “às escuras” e em uma “plataforma clandestina”, com a previsão de desembolsar até R$ 2.822.393,26 do bolso dos contribuintes para a construção de praça no Bairro Morada da Barra.

Entre outras irregularidades, a Souza & Costa Construções e Reformas Ltda disse que a prefeitura de Resende não publicou a licitação no Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro e em jornal de grande circulação.

Para se ter uma ideia do valor de obras desse tipo, em 2019 a prefeitura de Vila Pavão (ES) anunciou a contrução de uma praça multiuso no centro da cidade capixaba. A construção, de quase 900 metros quadrados ficou a cargo da Construtora Martelo ao valor de R$ 809,6 mil, cerca de R$ 2 milhões a menos que a praça em Resende.

O empreendimento de Vila Pavão previu um pátio externo pavimentado com blocos tipo pavi ‘S” estilo tijolinho; auditório / salão de eventos com área de 119,50m² contendo copa, palco interno e climatização; palco para apresentações culturais e de artistas locais em pequenos eventos; banheiros; playground infantil com caixa de areia de 39,83m², contendo diversos brinquedos; paisagismo, com construção de canteiros de flores e plantas ornamentais, plantio de árvores na lateral esquerda da praça e na calçada, instalação de diversos vasos de plantas, jardineiras nas janelas da fachada. Construção de banco com extensão de 19,00m na lateral esquerda da praça, com estrutura em alvenaria e assento em madeira ripada, e instalação de diversos bancos em ferro e madeira, entre outros.

Em janeiro, a Conselheira Andrea Martins estipulou um prazo de cinco dias para a prefeitura de Resende se manifestar sobre as irregularidades alegadas.

Simão não aparece

No que tange o pregão 76/2025, da licitação fracassada da hospedagem em hotel, o valor poderia chegar a R$ 5 milhões por ano, caso fosse alcançado o valor da diária de R$ 142 para até 96 pessoas durante 365 dias.

A concorrência poderia ter sido vencida facilmente caso a única concorrente não fosse uma papelaria localizada em Sorocaba (SP), distante 376 quilômetros do centro de Resende, onde deveria estar localizados os concorrentes, de acordo com o edital.

Pelo que consta na ata, a desclassificação da Vick Supply Papelaria aconteceu 30 minutos após o exame da documentação da empresa, que, segundo a prefeitura, não atendeu ao item 3.1 do edital: “As propostas e os documentos de habilitação deverão ser enviados exclusivamente por meio do sistema, até a data e horário estabelecidos no preâmbulo deste edital, observando os itens 4 e 5 deste Edital, e poderão ser retirados ou substituídos até a abertura da sessão pública”.

Para conferir a ata, clique aqui.

A proposta da papelaria foi o valor máximo das 96 diárias, R$ 13.632. Mas, para os observadores mais atentos, o edital publicado pelo governo do prefeito Tande Vieira possui vícios de direcionamento, porque obriga que o hotel esteja localizado na região central da cidade e, indiretamente, tenha o quantitativo mínimo de 96 apartamentos para atender uma eventual lotação, já que as unidades devem ser individuais e com banheiro privativo, além de TV em cores e café da manhã.

Quem também parece não ter se interessado pelo certame, que veio à tona na semana passada, foi o Hotel Espigão, localizado no Bairro Campos Elíseos, região central de Resende. O estabelecimento seria da família do empresário Markus Vinicius Simão, dono da empresa MVS Produções, que acumula diversas denúncias ao Ministério Público por supostamente comandar uma espécie de cartel para comercialização e produção de festas realizadas por prefeituras de cidades do sul fluminense.

Ano passado, por exemplo, a Exposição Agropecuária de Resende (Exapicor), que é a festa de aniversário da cidade, chegou a ser adiada por denúncia de direcionamento da licitação para a vitória da MVS de Simão. O evento de 2024, que acontece anualmente entre o final de setembro e o início de outubro, chegou a ser suspenso por determinação do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro, TCERJ, e a festa aconteceu depois das eleições municipais.

A decisão da Corte de Contas aconteceu depois do acolhimento de denúncias de que o edital infringia diversas diretrizes da lei federal de licitações (14.133/2021) através de um rol de exigências desnecessárias. De acordo com a representação, acolhida naquela ocasião, o governo do então prefeito, Diogo Balieiro, objetivou unicamente direcionar a concorrência para a vitória da empresa MVS de Simão.

No início desse ano, o MP voltou a receber denúncias relacionadas ao suposto “cartel de Simão”, referentes à comercialização do Carnaval. Segundo a denúncia, que também foi objeto de relatos nas redes sociais, um dos artifícios do direcionamento do edital estão a oneração à produtora do evento, exigência de diversos documentos fora do que prevê a lei e, frequentemente, a escolha da modalidade de pregão presencial.

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