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Mortos “saem dos túmulos” no cemitério de Resende

Coisas estranham andam acontecendo no Cemitério do Alto dos Passos, em Resende: mortos estão “saindo dos túmulos” ou os jazigos estão sendo violados. Essa segunda é a principal possibilidade para explicar o desaparecimento ou exposição de corpos inteiros fora das sepultura, como um que aparenta ser de uma mulher, veiculado nos últimos dias nas redes sociais.

O assunto vem sendo relatado em publicações do advogado Derik Roberto, que foi ao local após ser procurado por familiares de pessoas falecidas, cujos restos mortais não foram encontrados após visita de familiares aos túmulos.

Em um dos vídeos, a mãe de um menino exibe as roupas que o filho foi enterrado, após vir a óbito por ter sido asfixiado em uma creche municipal em 2019, segundo ela. A vestimenta, segundo ela, foi só o que restou.

“Sou a mãe do Elizeu, o bebê Elizeu que faleceu em 219, que mataram sufocado na creche. Vim aqui dar uma olhada no túmulo dele, a única coisa que a gente achou foi a roupinha… nem um pedaço da ossada nem da arcada dentária. Cadê o corpo do meu filho? Aqui é comprado, não é doado pela prefeitura”, disse a mãe da criança.

O advogado destacou que, além do desrespeito com a família e com os mortos, o problema é de saúde pública e revelou que os funcionários do cemitério dizem “não fazer ideia” do que está acontecendo. Porém, pelas imagens, é possível perceber que o problema é recorrente no cemitério, que se encontra abandonado pela prefeitura, de acordo com relato dos moradores.

Zumbi da propina

Ao que tudo indica, o Ministério Público terá que ser acionado para desvendar o mistério dos “mortos que saem dos túmulos em Resende, já que o prefeito Tande Vieira parece ocupado demais em postar fotos fofas nas redes sociais e os vereadores nada fazem para fiscalizar o alcaide. Porém, há uma “zumbi da propina” que talvez possa ser encontrada perambulando pelos cofres públicos da cidade do sul fluminense, segundo uma denúncia feita esta semana ao MP.

Segundo a denúncia, que cita o ex e o atual prefeito, Diogo Balieiro e Tande, a suspeita seria Fernanda de Araújo e os repasses teriam como origem as transferências da prefeitura de Resende à Fire Works através de dois contratos: a reforma de um antigo hospital anunciado como futura sede de um hospital do câncer e a construção de um centro cirúrgico nas dependências do hospital municipal de emergência. As contratações somam quase R$ 23 milhões e as obras estão mais de um ano atrasadas, segundo outras denúncias já encaminhadas ao MP.

As informações levadas ao conhecimento do MP apontam duas contas bancárias de Fernanda, além da conta da Fire Works, para um eventual cruzamento de dados em caso de quebra de sigilo bancário. Além disso, o MP também foi informado dos possíveis endereços da suspeita.

“Informo que, caso o MP encontre a Sra. Fernanda e consiga judicialmente a quebra de sigilo bancário e telefônico dessa meliante, logrará êxito em desbaratar não só os esquemas espúrios de propina da Fire Works, mas também outros, que tanto lesaram o erário e ajudaram a promover políticos corruptos como os senhores Diogo e Tande, que saquearam os cofres públicos através da saúde e outras áreas”, diz a denúncia.

A reportagem teve acesso a duas contas que podem ajudar o MP a refazer o caminho da propina, uma da Fire Works e outra de Fernanda.

Outra informação repassada dá conta de uma transferência de R$ 46.200 da empresa Kadora Commercial, sediada no Rio de Janeiro, a Fernanda em 2019.

O documento dá a entender que Fernanda é antiga na intermediação de pagamentos de propina, porém não é possível afirmar se a Kadora possui relação com a Fire Works, já que os representantes de ambas as empresas possuem o sobrenome “Ferreira”.

Mais denúncia ao MP

Esta semana, o MP recebeu mais uma denúncia relacionada ao possível superfaturamento e desvio de dinheiro público através das duas obras, que, ao todo, envolvem quase quatro anos de muito estardalhaço nas redes sociais por Diogo Balieiro e Tande Vieira, sem que os recursos anunciados com as construções, cerca de R$ 40 milhões, se convertessem em melhorias para a população.

De acordo com a denúncia, a prefeitura de Resende celebrou um total de R$ 22,9 milhões em dois contratos com a construtora Fire Works, em dezembro de 2022 e em junho de 2023, para a construção de um centro cirúrgico e a reforma de um antigo hospital particular anunciado como futura sede de um hospital oncológico. Os contratos, segundo a denúncia, estão com sobrepreço e as obras deveriam ter sido entregues há mais de um ano.

“Solicito medidas legais e de investigação cabíveis desse respeitável Ministério Público, considerando a omissão e possivelmente cumplicidade dos vereadores de Resende, que nada fazem para fiscalizar e combater o mau uso do dinheiro público através de contratos superfaturados e possivelmente com pagamento de propina, como os que ora denuncio… Além do prazo, são obras de pequeno porte se comparadas a construções semelhantes, a preços 50% a 80% menores. Desta forma, seria apropriada a quebra de sigilo bancário da Fire Works porque os preços aparentam estar claramente superfaturados e em Resende se fala em pagamento de propina, inclusive por Pix, a pessoas diretamente ligadas ao ex-prefeito Diogo Balieiro e ao atual prefeito, Tande Vieira. Sendo assim, importante atuação do MP se faz necessária, dada a possibilidade de desvio de dinheiro público”, diz a denúncia

Quatro anos de conversa e R$ 40 milhões

Em 2021, o ex-prefeito e o então secretário de Saúde Tande Vieira anunciaram a desapropriação de um hospital particular no Bairro Jardim Jalisco por cerca de R$ 5 milhões, a fim de que o local fosse reformado para construção de um posto oncológico ligado ao Serviço de Oncologia (ONCOBARRA), sediado em Barra Mansa, que é a unidade de referência do SUS para tratamento de câncer no sul fluminense. A informação não foi confirmada pelo ONCOBARRA e a prefeitura de Resende até hoje não esclareceu como irá manter um Hospital do Câncer sem verba do SUS.

Em abril de 2023, Diogo e Tande, então deputado estadual, receberam o então secretário de saúde Dr. Luizinho e um cheque simbólico de mais de R$ 27 milhões para o Hospital do Câncer, entre outros. Naquela ocasião, a prefeitura de Resende já havia anunciado a construção de um centro cirúrgico de cinco salas no Hospital Municipal Henrique Sérgio Gregori ao preço de R$ 7 milhões. A obra, também a cargo da Fire Work, permanece inacabada após umas de um ano do prazo contatual.

Números apontam para superfaturamento

As obras do Diogo e Tande podem ter drenado milhões de dinheiro público, segundo a denúncia. A se comparar os preços dos contratos da prefeitura de Resende com obras de maior porte, essa possibilidade ganha força. Para se ter uma ideia dessas distorções, o contrato 97/2023 previa R$ 15.811.940,66 para reforma do antigo hospital Policlínica no Bairro Jardim Jalisco, um prédio de três andares. Esse montante é 70% dos R$ 23 milhões que a prefeitura de Novo Hamburgo (RS) anunciou para a construção do Anexo II do Hospital Municipal da cidade gaúcha.

O outro contrato (257/2022), de R$ 7.092.616,91 para a construção de um centro cirúrgico com cinco salas, é 140% superior ao R$ 3 milhões investidos pela prefeitura de Contagem (MG) para construção do Centro de Cirurgia e Traumatologia do Complexo Hospitalar da cidade mineira.

O legado de Daniel Brito

Segundo uma servidora da saúde, os R$ 40 milhões que envolvem o Hospital do Câncer seriam suficientes para construção de 100 postos de saúde de dois andares, como a da Unidade de Saúde da Família do Bairro Liberdade. O posto foi erguido entre 2010 e 2012 pelo ex-secretário de saúde de Resende Daniel Brito, considerado o grande responsável pela guinada no atendimento público à população.

Daniel Brito faleceu em agosto de 2022 vítima de um infarto fulminante, quando o médico e militar reformado tinha 68 anos. Em relação ao posto de saúde citado por ela, o prédio tem dois pavimentos e um elevador, destinado aos pacientes com dificuldades de locomoção, consultórios médico e odontológico, sala para educação em saúde, para fisioterapia, para curativos, Central de Esterilização, Dispensário de Medicamentos, entre outros, além de recepção com ar condicionado e televisão. A construção é muito maior que a reforma de R$ 15 milhões de Diogo e Tande.

Brito salvou a Santa Casa de fechar as portas no início de 2016. Na época, Brito não só atuou para cobrir um rombo mensal de R$ 126 mil na folha de pagamentos da Santa Casa como deu início a uma série de exames e procedimentos de saúde que começaram a ser realizados no local pela chegada de novos equipamentos. Além disso, o ex-secretário acionou diversas empresas, que ajudaram na restauração, mobília e compra de novos equipamentos para a unidade, entre elas a Volkswagen e a INB.

Essas empresas também estiveram ao lado de Brito em 2010, quando o ex-secretário evitou que o setor de Ortopedia fechasse. Na ocasião, ele já havia aumentado os repasses de verba pública para R$ 1 milhão à Santa Casa.

Santa Casa: da salvação à suspeita de desvio de verba

O montante, estimado em cerca de R$ 100 milhões nos últimos anos, foi objeto de uma denúncia do deputado estadual Filippe Poubel (PL) na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) em agosto do ano passado. Poubel apontou um suposto esquema de desvio de verba na Santa Casa por Diogo e pelo ex-diretor Kaio do Diogo, atual prefeito de Itatiaia. O deputado disse ainda que os vereadores da base do governo de Diogo se negaram a aprovar um requerimento de pedido de informações por ordens do então prefeito.

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